Saudoso E-mail
Quando
o e-mail surgiu, foi considerado um meio prático, porém frio de se
corresponder. Mas agora que o e-mail foi reduzido a pó pelo Face, WhatsApp
& cia., agora que ele sobrevive apenas para a troca de mensagens
profissionais (e olhe lá), agora que ele respira por aparelhos, já podemos
lembrar, nostálgicos, de como ele era refinado.
Martha Medeiros
O
e-mail entrava discretamente na sua caixa de mensagens e ficava ali, quietinho,
aguardando pacientemente o momento em que o destinatário pudesse lê-lo e
respondê-lo. Havia todo o tempo do mundo para isso. A resposta podia ser bem
articulada, revisada e enviada sem nenhuma aflição. Claro que não era agradável
deixar alguém aguardando uma semana, mas na maioria das vezes não levava tanto
tempo assim, o retorno geralmente era dado no mesmo dia ou no dia seguinte, e
isso era suficiente para comemorar esta vibrante conexão virtual.
Isso
foi ontem. Anteontem. Um século atrás. Dá no mesmo.
Agora
você troca mensagens instantâneas, um toma-lá-dá-cá que faz todo mundo parecer
meio esquizofrênico. A questão do corretor de texto é uma insanidade. “Oi,
Patricia!’’ se transforma em “Ouviu, patife!’’ e o que era para ser um gentil
cumprimento vira um insulto. Não preciso dar outros exemplos, você passa por
isso todos os dias: corrigir com avidez as bananices que o corretor comete à
revelia.
Mas
o mais grave nem é isso.
É
ter que responder de bate-pronto. Eu às vezes não sei exatamente como reagir a
algo que me escreveram, gostaria de ter ao menos cinco minutos para processar a
informação e entender o que estou sentindo antes de mandar uma resposta, cinco
minutos não é tanto tempo assim, é? Ora, em cinco minutos o interlocutor já se
atirou do oitavo andar, sentindo-se rejeitado pelo meu silêncio. Não senhora,
você não pode pensar nem cinco, nem dois, nem meio segundo, precisa escrever
feito um raio, num flash, sem pestanejar, porque o outro está digitando ao
mesmo tempo e isso configura um duelo, ganha quem disparar primeiro. Portanto,
seja ligeira e tenha presença de espírito — ia esquecendo: é imperativo mostrar
que é engraçadinha.
Só
que não sou engraçadinha. Sou cautelosa. Ponderada. Gosto de construir frases.
Criar raciocínios. Sou escritora, dê um desconto. Não consigo me contentar com
frase de telegrama, que é uma coisa bem antiga, se não me falha a memória.
Bom
mesmo seria se a gente continuasse a se comunicar frente a frente, transmitindo
nosso estado de espírito com o próprio rosto, sem precisar do auxílio de algum
emoji. Se a gente pudesse falar com calma e o outro responder com calma. Mas
isso parece que também é coisa muito antiga.
Nasci
atrasada, estou sempre correndo atrás do tempo: aquele tempo que o e-mail me
dava pra pensar.Martha Medeiros