Um dia...
Um
dia ouvi que eu era a pessoa mais importante para alguém. Na época, aquilo era
essencial para mim: ser promovida pela reciprocidade. E o tempo, imperador dos
destinos todos, desgastou os mármores, mas manteve intacto aquele amor: ele
sobreviveu à relação finda. E eu perdera o meu alto cargo de importância para
aquele alguém. Convalescente, mas em recuperação da suposta infelicidade de um
ego magoado, tive que descobrir outra forma de amor: uma espécie rara que dá
perenidade ao bem-estar e põe o ego em seu lugar. Eu me tornei a pessoa mais
importante para mim. Quem poderia me tomar isto? O tempo? Hoje, as pessoas vão
e vêm. Recebo-as, rejeito-as, tolero ou amo. A poesia não me tira os
sentimentos vis, nem as doçuras de um ser humano. Um dia me chamaram de
radical. Aceitei: só eu sei a importância que as coisas têm para mim e o
propósito de mantê-las ou não na minha vida. Em outra ocasião, me chamaram de
amorosa. Compreendi: pessoas amoráveis extraem o que tenho de melhor. Já me
disseram que pareço um personagem. Entendi: sendo povoada por tantas, quão
imprevisível posso ser na liberdade que me permito ter. Não me importo com o
que julgam, sempre serei espelho e sempre terei o Outro como meu espelho. Somos
extensão. Estejamos ou não em harmonia ou comunhão, dedico carinhosamente o meu
tempo compartilhando minha nudez. Aos que veem máscaras e vestes, sou impotente
a estas leituras. Aos que veem generosidade e amparo, sou impotente à beleza
que me dão. Sou impotente ao olhar alheio. Não tenho o controle de
absolutamente nada, mas o meu trabalho consiste em eu não me rejeitar.
Diariamente
eu fortaleço minha autoestima assim:
Hoje,
nem que seja apenas hoje, eu sou a pessoa mais importante para mim.
Que
assim eu esteja.
Que
assim seja.
Marla
de Queiroz